Jovens & Empreendedores
Recentemente li uma entrevista dada pelo
Ayrton Senna, em 1986, ao
Programa Roda Viva (confira a entrevista
aqui). Onde você consegue perceber como a
personalidade faz a diferença para que a pessoa obtenha sucesso. Separei algumas partes da entrevista e tentei associar ao empreendedorismo. Veja o que acha:
O que você sentiu quando chegou em segundo e o Nelson Piquet em primeiro no Grande Prêmio Brasil?
Ah, eu não senti nada, eu estava ali querendo ganhar, não tenho dúvida disso, não deu para ganhar? Fazer o quê? Eu vou tentar no outro ano. E vou tentar tantas vezes, tantas vezes quantas eu correr, mas quando você corre, você depende de um carro e de uma equipe. Não é como tenista, que tem a raquete e a bolinha de tênis. Então, não depende só de você. Você tem que, realmente, trabalhar em equipe.
Aplicando isso a uma empresa. Ninguém vai para frente sozinho. Você precisa dos seus funcionários, dos seus fornecedores, dos seus amigos (para divulgar mais o negócio), dos parceiros. Você é o piloto, mas necessita dessa equipe para sustentá-lo, para fazer a máquina funcionar. Além disso, você precisa de uma máquina de qualidade, senão seus concorrentes na pista vão te ultrapassar. O seu produto precisa ter um diferencial. Seja no motor, na aerodinâmica, enfim, sua empresa deve ser a somatória de um piloto consciente e habilidoso, com uma equipe que trabalha à favor desse piloto e que constrói um carro que as outras equipes jamais alcançarão.
Quais foram as suas dificuldades depois do kart até a Fórmula 1, passando pela Fórmula 3 e tudo mais?
Eu comecei no kart, como todo mundo sabe, por quem tenho um carinho enorme. É o esporte mais emocionante que existe. Mais que a Fórmula 1, inclusive, pois você faz com mais amor ainda. Eu diria que as dificuldades maiores que um piloto encontra no início da carreira é justamente porque você tem que provar primeiro para conseguir o apoio. E você precisa do apoio para chegar lá. Então eu tive a felicidade de ter o apoio da minha família. Sempre, desde o início, estiveram por de trás, me seguraram nas horas mais difíceis e me deram a oportunidade de poder desenvolver essa atividade desde pequeno.Tive, então, a possibilidade de correr em bons karts, com bons motores, em bons carros, em boas equipes e dali pude me dedicar totalmente a essa profissão. Então, o difícil é você conseguir o tal do patrocínio no início, porque depois que você cria uma imagem, um nome, os patrocinadores vêm até você, e ali a necessidade já não é tão grande. Justamente no início, quando você não tem ainda a imagem, um nome, é que você precisa dos patrocinadores para chegar lá."
O ínício não é fácil, ninguém vai confiar no seu produto. As pessoas vão duvidar da sua capacidade. É nesse momento que o teste se inicia a cada empreendedor. O que você vai fazer para ser percebido? O que você vai fazer para que as pessoas notem que você existe? Qualidade? Design? Inovação? É nesse início que você deve apostar suas fichas. É no início que você deve investir mais do seu tempo, criatividade, disposição, comunicação. É nesse tempo que você vai receber muitos "não" e quase nenhum "sim". Mas passada essa fase os patrocinadores virão até você. O difícil é passar por ela.
Qual é o seu nível de cobrança para com você mesmo?
A dedicação que eu tenho para o automobilsimo é tão grande, mas é com tanto prazer, é com tanta vontade, com tanto amor e isso vem desde pequeno, desde o tempo do kart que, realmente, eu acredito que a gente têm condições de lutar de igual para igual. E acreditando nisso é que eu procuro tirar o máximo de mim. Isso começa já na hora que você está se preparando psicologicamente, no início do ano, nessa época em que você tem que treinar bastante para se preparar fisicamente, para, na temporada, estar bem. Então, quando eu vou fazer 7 ou 8 km por dia, o que não é fácil, chega no meio dos 3 ou 4 km você já está pedindo água. Agora, a motivação é de saber que eu vou ter uma equipe, com 200, 300 pessoas trabalhando. Eles estão lá acreditando em mim, que eu vou estar lá na hora do "vamos ver" e que eu vou corresponder a expectativa deles. Então eu corro 7 km ou 8 km e vou em frente e essa vontade de vencer é o que me mantém. É a minha motivação maior. É a vontade de vencer é o que me mantém participando numa corrida, num campeonato de Fórmula 1. Não existe nada mais, assim... que me dê mais motivação do que isso. Então eu acho que o amor que eu tenho pela minha atividade é o que me matém e é a maior força que eu tenho.
Amor e vontade de vencer, motivações que nunca falham. Se você ama o seu trabalho, ele passa a não ser um trabalho mas sim o seu hobby. Se você não ama o seu trabalho você faz o que a maioria está habituada a fazer "reclamar" e continuar na mesma vidinha em que se encontra. Se você ama o que faz, pensa em jamais desistir, pensa em dar o melhor de si todos os dias, pensa em superar seus limites criando novos objetivos a serem alcançados. Se você ama o que faz, jamais se imaginará sem fazer isso. Jamais achará qualquer tipo de esforço em vão, por que afinal não será um sacrifício. Será um prazer à mais.
"Quando eu estava na Toleman, durante um treino para o Grande Prêmio da Inglaterra, um companheiro meu, logo no início do treino, saiu e deu uma batida de frente no guard rail, quebrou as pernas, quebrou o carro no meio e eu passei do lado dele. Ele parado no meio da pista, com as pernas encostadas no chão, o carro tinha quebrado todo na frente e eu vi aquilo e voltei pro box, procurando saber o que eu estava fazendo ali. Então foi paralisado o treino durante muito tempo, até eles abrirem novamente e o meu chefe de equipe chegou e falou: 'Olha se você não quiser andar mais, nesse final de semana que tiver o Prêmio da Inglaterra, uma equipe inglesa imagina, você não precisa andar'. Então ele colocou nas minhas mãos, para eu decidir se eu queria ou não andar. E eu deveria andar, obrigatoriamente, porque eu tenho um contrato com a equipe. Então aquilo tudo confunde se você não estiver realmente muito certo daquilo que você está fazendo e porque você está ali, tudo aquilo confunde. E o medo é uma das piores coisas que pode acontecer com um piloto, porque você nunca pode perder a confiança. Tem que manter sempre uma confiança de estar fazendo a coisa certa e dentro dos limites."
Você não pode deixar que problemas pessoais ou medos dominem sua mente e seu corpo. Você deve se comprometer com aquilo que está fazendo. Como disse Ayrton, se você perder a confiança o carro não sai do lugar, você não vence uma corrida sequer. Mesmo que sua equipe trabalhe direito, seu carro seja o melhor e o mais bem preparado, não adianta, se você, o piloto, não confiar em você mesmo não tem como vencer seus concorrentes e ganhar a corrida. Como vencer se nem mesmo você acredita que isso vai acontecer?
Como é que você relaxa, como é que você se prepara, como é que é a tua noite de sono no dia que antecede uma prova decisiva para você?
É muito relativo. Depende como é que está o carro. Se o carro estiver bom, se tiver numa posição boa... Então aquilo é uma pressão um pouco maior porque você sabe que tem condições, que depende de você. Mas ao mesmo tempo é uma motivação, e então é um prazer, de saber que você tem condição de, no dia seguinte, de lutar. Quando o carro está ruim, aí é uma droga. Você não dorme, fica pensado no que você vai fazer, o que você vai inventar para conseguir tirar aquela diferença. Então, aí não tem sono que resista.
O que acontece quando tudo está correndo como o esperado? Você, normalmente, relaxa. O que acontece se uma mudança repentina acontecer? Você não estará preparado e não vai conseguir lidar com ela. Quando uma crise vier você vai ter que inventar maneiras de tirar essa diferença. Esse é o momento, como disse Ayrton, onde não se tem mais sono. Você entrará na pista, para brigar, não pela primeira posição, mas para ao menos completar a corrida. Para esses momentos preparação é essencial, principalmente a psicológica. Acredite, mais cedo ou mais tarde, esses momentos virão.
Como é que você faz para dirigir tão bem na chuva?
Eu tomei muita chuva, viu? [risos] No tempo do kart eu tomei muita chuva... Olha, foram várias as vezes que, durante a semana, eu ia para Interlagos, saía da escola, meu motorista ia me buscar lá ao meio-dia, com os karts atrás, na carreta, e me levava para pista em Interlagos. Terça, quarta ou quinta, passava a tarde inteira lá treinando. E se chovia, eu não parava e ficava no box, não, eu continuava treinando. Mexia no kart, aprendi a ajustar e andar no molhado. E uma coisa muito importante, eu tenho certeza que a maioria das pessoas não percebe, é que eu tenho ainda os 26 anos de um jovem que tem o ímpeto, aquela força, aquela vontade enorme, aquela garra. Mas tenho a experiência de um piloto de 35, 40 anos, por ter começado tão cedo no kart e por eu ter dedicado tanto tempo. Então, toda a experiência que eu adquiri no kart, que foi a minha maior escola no automobilismo, foi enorme. Eu estive15 anos de kart e 15 anos assim de profissional, era um hobby, mas eu me dedicava como profissional.
O que Ayrton pode ensinar quando diz que tomou muita chuva? Que é essencial se expor às dificuldades e enfrentá-las. O que é seu ponto fraco hoje, se trabalhado hoje, pode se tornar um diferencial amanhã. Talvez seja necessário ficar 15 anos treinando, perdendo, errando, obtendo pequenas vitórias, para só então a coisa começar a dar certo, mas você vai ter que passar pelo Kart para chegar a Fórmula 1. Isso vai amadurecê-lo. Vai permitir que chegue na F1 com experiência, com tranquilidade, autocontrole, força. Empresas que crescem rápido demais não tiveram esse tempo, e por passar rapidamente do Kart para a F1, cometem erros que só podem ser admitidos no Kart e, por isso, acabam durando muito pouco na F1. Uma empresa deve crescer devagar, aprendendo com erros pequenos e, de preferência, com pequenas perdas de dinheiro.
Esses foram os ensinamentos que pude retirar da entrevista. Veja abaixo algumas frases ditas pelo Ayrton que marcaram sua carreira:
"Não sei dirigir de outra maneira que não seja arriscada. Quando tiver de ultrapassar vou ultrapassar mesmo. Cada piloto tem o seu limite. O meu é um pouco acima do dos outros".
"Acidentes são inesperados e indesejados, mas fazem parte da vida. No momento em que você se senta num carro de corrida e está competindo para vencer, o segundo ou o terceiro lugar não satisfazem. Ou você se compromete com o objetivo da vitória ou não. Isso quer dizer: ou você corre ou não".
"Se você quer ser bem sucedido, precisa ter dedicação total, buscar o seu último limite e dar o melhor de si".
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